O ensino da enfermagem, no Brasil, foi institucionalizado em 1923, com a criação da Escola de Enfermagem Ana Nery e, no estado da Bahia, apenas em 1946 é que se deu a criação da então Escola de Enfermagem da Universidade da Bahia (EEUB), através do Decreto Lei 8.779 de 22 de janeiro de 1946. A criação dessa Escola estava relacionada com a necessidade de formação de um maior número de enfermeiras para trabalhar em hospitais, organizações que, na década de 40 do século XX, se expandiam no país.
A introdução da enfermagem moderna na Bahia ocorreu ao mesmo tempo em que o Hospital das Clínicas, já ao término da sua construção, era preparado para entrar em funcionamento, o que exigia enfermeiras qualificadas para a composição do seu quadro de pessoal.
A criação da Escola de Enfermagem da Universidade da Bahia se insere, portanto, no bojo do incipiente processo de industrialização do país que, naquela fase, sacudia todos os setores da vida do país, inclusive o setor saúde, com o movimento de organização de novos hospitais e de reorganização de outros hospitais públicos.
O então reitor da Universidade da Bahia, professor Edgard Santos entendeu que um novo modelo de um hospital-escola exigia a presença da enfermeira de "alto padrão”. A criação da Escola de Enfermagem, portanto, e a sua incorporação à Universidade da Bahia foi obra do Magnífico Reitor que propiciou condições dignas para a sua instalação, para a composição do seu corpo docente, estruturação do seu currículo, enfim, para o desenvolvimento das suas atividades. O reitor contribuiu para que a Escola se tornasse uma organização que viria servir de modelo, não apenas para a própria Universidade, mas para instituições similares no país.
O reitor foi à Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) e, com o apoio da sua diretora Edith Magalhães Fraenkel, identifica Haydée Guanaes Dourado como tendo o perfil adequado para a diretoria da nova Escola. Enfermeira "alto padrão” Ana Nery, funcionária do Ministério da Educação e Saúde, bacharel em ciências sociais pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, pós – graduada pela Universidade de Toronto, Canadá, e membro do corpo docente da Escola de Enfermagem da USP, Haydée Dourado iniciou o seu trabalho seis meses depois da criação da Escola.
As instalações físicas da diretoria da Escola limitavam-se, a princípio, à própria antessala do gabinete do reitor e, com o início do curso, recebeu uma sala nas dependências do Hospital das Clínicas, local este que servia, também, de hospedagem para as novas professoras. Somente depois de três anos da implantação do curso, seria a Escola de Enfermagem transferida para o moderno e bonito prédio de sete andares, onde se encontra até hoje.
Ao longo de várias décadas, foram introduzidas modificações na distribuição dos espaços da Escola, incluindo a residência das estudantes de enfermagem, que vinha de uma tradição anglo-americana e fora absorvida pelas Escolas Ana Nery e da USP, e que foi desativa nos anos 70. Tais instalações proporcionavam um maior convívio entre as estudantes e entre estas e as professoras, além de facilitar o recrutamento para o curso, com estudantes do interior e de outros estados. De outra parte, facilitava o transporte, em ônibus exclusivo da Escola, das estudantes para os campos de prática, que, invariavelmente, tinha início às 7:00.
Continuando o seu trabalho, objetivando a divulgação do curso, D. Haydée Dourado visitou organizações que reuniam jovens, como, por exemplo, as Bandeirantes, movimento, à época, muito atuante na comunidade soteropolitana. Também, influentes famílias da sociedade baiana abriram os seus salões para ouvir sobre a nova profissão. Esses contatos pessoais se multiplicavam, sobretudo entre as jovens e, com isso, melhoravam as avaliações referentes à profissão.
Havia, ainda, que se vencer uma outra barreira cultural relacionada ao trabalho da mulher fora do lar, sobretudo envolvendo a execução de atividades inerentes ao cuidado humano. Ademais, o rigor no cumprimento dos horários diurnos e noturnos, inclusive aos finais de semana e aos feriados, não era o que os pais queriam para as suas filhas. A preferência era, nitidamente, para as carreiras com maior prestígio social, mas a crença de que existam profissões para mulheres e para homens, limitava a escolha das jovens. Portanto, fora do magistério, àquela época, poucas eram as oportunidades oferecidas às mulheres. A enfermagem, embora com rejeição social, se apresentava como mais uma opção de campo de trabalho para as mulheres.
O curso teve início no dia 12 de março de 1947 e a diretora proferiu a aula inaugural sobre História da Enfermagem. O excelente desempenho acadêmico das estudantes nas, então de denominadas, matérias básicas logo circulou na Universidade, criando um clima saudável e de seriedade entre as acadêmicas, além de uma boa reputação do curso que se iniciava.
Posteriormente, com o ingresso de mais uma turma de estudantes, a Escola já contava com mais professoras vindas de São Paulo. O grupo era formado, entre outras, pela Profª. Olga Verderese, que, além de assumir a vice-diretoria da Escola foi indicada, também, para a primeira chefe do serviço de enfermagem do Hospital das Clínicas. Naquela época, cabia às novas enfermeiras/professoras a responsabilidade de planejar e organizar o serviço e enfermagem daquele hospital.
É importante assinalar que o currículo da Escola fora planejado obedecendo as mais modernas concepções sobre enfermagem da época. Logo no primeiro ano, as alunas cursavam as disciplinas básicas como anatomia, fisiologia, microbiologia, bioquímica, parasitologia, além de iniciação à saúde pública, com bioestatística, epidemiologia, introdução à sociologia e à psicologia e aos problemas sociais da prática em enfermagem. Calcula-se que o currículo tenha tido uma carga horária de mais de 5.000 horas e que foi integralizado em quatro anos de duração.
Como disciplina extracurricular, as estudantes tinham a oportunidade de estudar inglês em cursos ministrados por voluntários da colônia americana. A frequência a concertos de música erudita e de outras atividades culturais era feita como parte da formação geral da futura enfermeira.
Com a promulgação da Lei 775/49 e seu Regulamento nº. 27.426/49, o ensino em enfermagem torna-se matéria de Lei, com predominância de carga horária para disciplinas de biomédicas, com limitação para as disciplinas de caráter social. Tal proposta contrariava, inclusive, as recomendações do IV Congresso Nacional de Enfermeiras, realizado em Salvador, em 1950, que apontava "a necessidade de acentuar-se o ponto e vista das medidas preventivas em saúde, em todas as matérias do curso”.
Ainda no ano de 1948, dois eventos marcam a história da EEUFBA. O primeiro refere-se à organização do primeiro curso de pós-graduação lato sensu de uma escola de enfermagem do país. O objetivo do curso foi capacitar, através de um curso de especialização, as professoras da Escola. A Profa. Haydée Dourado, autorizada pelo Conselho da Escola, organizou o curso e o Prof. Anísio Teixeira foi convidado pelo reitor para ministrar as aulas. Quanto ao segundo evento, trata-se da posse da Profa. Olga Verderese como a primeira presidente da recém-criada Associação Brasileira de Enfermeiras Diplomadas, Seção Bahia, que posteriormente passou a se chamar Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn).
INAUGURAÇÃO DO PRÉDIO DA EEUFBA E FORMATURA DA 1ª TURMA DE ENFERMEIRAS
O Jornal "A Tarde”, na edição de 11 de dezembro de 1950, publicou a matéria: [...]"com a solenidade de formatura da primeira turma de enfermeiras baianas, encerrou-se, sábado à noite, o IV Congresso Nacional de Enfermagem, que teve como sede a nossa capital. A cerimônia realizou-se às 20 horas, no salão nobre da Faculdade de Medicina, ocupando a presidência da mesa o Ministro da Educação Dr. Pedro Calmon [...]. Após a entrada das alunas, que se fizeram acompanhar da lâmpada simbólica, [...] usaram da palavra a oradora da turma, senhorinha Maria Juliêta Villas Boas, o paraninfo Prof. Adriano Pondé e a Sra. Waleska Paixão, diretora da Escola de Enfermagem Ana Nery, do Rio de Janeiro, que leu uma mensagem deixada pelas congressistas sul-americanas”.
Nesse mesmo dia, no período da tarde, com a presença do governador do estado da Bahia, Sr. Otávio Mangabeira, do Ministro da Educação, Dr. Pedro Calmon e do prefeito da cidade de Salvador, Sr. Wanderley Pinho, entre outras autoridades, foi inaugurada a Escola de Enfermagem. Todas as congressistas que participavam do IV Congresso Nacional de Enfermagem também participaram do ato de inauguração da Escola. Esse Congresso teve como tema "Trabalhemos para fortalecer a enfermagem nas Américas” e distinguiu-se pelo número de participantes de outros países, vindas ao Brasil com a finalidade de criar a Federação Interamericana de Enfermagem. Foi, ainda, no ano de 1950 que a diretora da Escola, então a Profa. Jandira Alves Coelho, passou a ter assento no Conselho Universitário, ficando, desse modo, consolidada a incorporação da Escola à Universidade da Bahia, conforme previsto no Art. 3º do 1º Estatuto da Universidade, Decreto 22.637 de 25/02/1947. Em 1952 assume a direção da Escola, pelos dez anos seguintes, a Profa. Nilza Garcia, a primeira diretora ex-aluna da Escola. Foi na gestão da Profa. Nilza Garcia que, em 1953, foi instalada a Congregação da EEUFBA, estrutura administrativa de deliberação superior das escolas de enfermagem com criação prevista pela legislação específica do ensino de enfermagem, Lei nº. 775 de 1949 e o Decreto 27.426 de 14/11/1949.
ORGANIZAÇÃO ESTUDANTIL
No primeiro dia de funcionamento da Escola, em 12 de março de 1947, a estudante Maria Juliêta Calmon Villas Boas foi eleita, entre as oito estudantes que integravam a primeira turma da EEUFBA, a sua representante. Além de Maria Juliêta, compunham a turma: Maria Ivete Ribeiro de Oliveira, Maria José de Oliveira, Jamile Cabús, Leônia Melro de Freitas, Maria Helena Rezende Ribeiro, Nilza Marques Maurício Garcia e Stella Alves dos Santos. No ano seguinte, com as estudantes em maior número, por conta do ingresso da segunda turma da Escola, foi constituído o Diretório Acadêmico (DA) que foi imediatamente filiado à organização estudantil estadual e, posteriormente, à União Nacional dos Estudantes. Maria Juliêta foi eleita a primeira presidente do Diretório Acadêmico permanecendo no cargo por dois anos consecutivos.